Subtema: Ancestralidade – A Semente de Nossas Lutas

Na primeira noite do Festival de Parintins 2023, o Boi Caprichoso entoou um canto de resistência e identidade com o tema “Ancestralidade: A Semente de Nossas Lutas”. A arena se transformou em um grande terreiro de memória, um chamado à valorização das raízes indígenas, negras e caboclas que forjaram a cultura amazônica. A apresentação foi um manifesto de orgulho e pertencimento, reafirmando que é na ancestralidade que germina a força para enfrentar desafios e manter viva a tradição.

Tema noite A do Boi Caprichoso 2023. Foto: Divulgação

Lenda Amazônica: Ypuré, a Senhora da Ganância.

Na primeira noite do Festival de Parintins 2023, o Boi Caprichoso encantou e conscientizou o público com uma apresentação grandiosa e cheia de significado. Sob o tema “Lenda Amazônica: Ypuré, a Senhora da Ganância”, o boi da estrela azul trouxe à arena um espetáculo que uniu ancestralidade, magia e uma mensagem de preservação ambiental, reafirmando sua identidade de boi da resistência e do protagonismo amazônico.

A Amazônia, rica em biodiversidade e cultura ancestral, é palco de muitas lendas que atravessam gerações. Entre elas, a história de Ypuré, a Senhora da Ganância, transmitida oralmente pelos povos indígenas Maraguá, se destaca como um poderoso alerta sobre os perigos da ganância desenfreada.

Ypuré é uma entidade mística, considerada guardiã da floresta e da vida que nela habita. Sua missão é proteger os recursos naturais e punir aqueles que, guiados pela ambição insaciável, invadem e destroem o equilíbrio da Amazônia. Ela não é uma simples protetora, mas uma força contra aqueles que se deixam corromper pelo desejo de explorar sem limites. Seu olhar é temido, pois revela um poder que se manifesta nas trevas da floresta e no som das águas dos rios. Qualquer um que ouse desafiar a harmonia da floresta estará sujeito a seu castigo severo.

Filha de Ypuré, Anhangá, conhecida como o “demônio dos caminhos”, também carrega em si a missão de proteger a floresta. Sua presença é um símbolo do castigo que aguarda aqueles que cruzam os limites impostos pela natureza. Anhangá não está sozinha; ela é acompanhada por outras criaturas, entidades e espíritos que percorrem os caminhos da floresta, sempre em vigilância, prontos para punir os que desrespeitam a vida selvagem. Esse exército de seres místicos reflete a natureza implacável do castigo que se aproxima para quem deseja mais do que a natureza pode oferecer.

Aqueles que sucumbem à ganância, à busca incessante por riqueza e poder, logo se encontram no caminho da destruição. Ypuré se faz presente, acompanhada de Anhangá, invadindo os sonhos daqueles homens sedentos por lucro. Ela os persegue com uma vingança, fazendo com que a obsessão por tesouros nas entranhas da floresta os consuma. Durante o dia, eles sentem a presença de Ypuré, um olhar que os observa, e à noite, nos seus pesadelos, ela oferece exatamente o que eles procuram, mas com um preço elevado: a transformação. Em um gesto de punição final, seus corpos se transformam em animais da floresta, condenando-os a nunca mais retornar aos seus lares.

Essa lenda nos faz refletir sobre os limites da exploração e os danos irreparáveis que a ganância pode causar. Ypuré, com sua figura aterrorizante e seu poder incansável, simboliza a força da natureza que, mesmo quando desrespeitada, nunca deixa de lutar pela preservação do que é sagrado. Ela não apenas pune, mas ensina que a verdadeira riqueza está na preservação e no equilíbrio, e que a destruição da natureza, motivada pela insaciabilidade humana, pode levar à própria perdição.

Na toada de Adriano Aguiar, Frank Ricardo e Ney souza, Ypuré e a Tocaia da Ganância, realmente conta a lenda de forma cantada: 

O louco encegueirado
Por ganância, maculado
Alucinado pelo ouro
Traficando animais na floresta
Ateia o fogo

Nos caminhos perdidos
Lugares esquecidos
Ela vaga, ela espreita
A te esperar
Ela sente teu cheiro de longe
Ambição de longe
Tua ganância de longe
A te observar

O vento para
Quando ela começa a chamar
As suas crias e feras
O vento para
Quando ela começa a chamar (chamar)
Teu grito reverbera agonia

Estronda como ventania
Deusa pele de ametista
Assombrosa Ypuré no encauto
Nas tuas mãos anéis de crânios
Daqueles infames

Animais feridos, ouro roubado
Ninhos corrompidos
Riachos contaminados
(A vingança é dela)

Ypuré e suas crias

Atormenta!
(Cabelo de fogo)
(Reluz o ouro no teu olhar)
Persegue!
(Deusas colossais)
(Filhas de Anhangá)

Atormenta!
(Cabelo de fogo)
(Reluz o ouro no teu olhar)
Persegue!
(Deusas colossais)
(Filhas de Anhangá)

(De dentro do redemoinho)
(Do mundo antigo vem)
(Peristálico fantástico)

(De dentro do redemoinho)
(Do mundo antigo vem)
(Peristálico fantástico)

A floresta cria vida
E alucina
(A floresta cria vida)
(E alucina)
Captura e tortura
(Captura e tortura)

Pode correr, se esconder
Que eu te caço, eu te acho
Pode correr, se esconder
Que eu te caço, eu te acho

Tapem os ouvidos!

As alegorias de Roberto Reis e equipe mostram as transformações de Ypuré em criaturas para combater os males dos homens. 

Lenda Amazônica do Boi Caprichoso 2023 na primeira noite. Foto: Divulgação

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